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domingo, 5 de dezembro de 2010

A importância do pai no pré-natal

 

O Dr. Jorge Naufal dá dicas práticas para os homens enfrentarem, e participarem intensamente, do período da gestação.
Hoje não se discute mais a participação do futuro pai no pré-natal da mulher grávida; aliás, diria que é imprescindível e necessário.
É recomendável sempre que possível, acariciar o abdômen da mulher, dizer palavras doces e meigas no sentido de procurar uma comunicação física com o feto que está sendo gerado, transmitindo todo o seu carinho e afeto para o filho que deverá chegar em breve.
Esteja convicto que o feto esta recebendo esta comunicação e emoção transmitida. A parede do abdômen e do útero não são obstáculos para este acesso, pois está provado que o feto percebe sons, temperatura, luz e movimentos que ocorrem na parte externa próxima à parede abdominal da grávida, portanto o diálogo da mãe ou do pai com o futuro bebê é totalmente viável.
Muitos maridos passam a tratar a mulher de maneira muito diferente da habitual, como se a esposa estivesse doente, cercando sua liberdade de movimentação ou expressão.
Recomendamos que o companheiro procure ser carinhoso, atencioso, e, principalmente, mostre atração física e psicológica pela mulher, que muitas vezes se sente fisicamente menos sensual pelo estado gestacional e mudanças de seu corpo. Portanto, carinho e atenção à mulher grávida nunca são demais.
A gestação é instável do início da gravidez até o quarto mês, quando a placenta passa a funcionar plenamente, substituindo o corpo amareIo na produção dos hormônios, e também as vilosidades coriônicas na alimentação do embrião. Até atingir esta fase, é maior a possibilidade de ocorrer o aborto e realmente ele ocorre em vinte por cento das primigestas (primeira gestação) isto significa que, de cada cinco gestantes, uma vem a apresentar aborto.
Nesta fase, devido ao risco maior de sangramento e aborto, a reIação sexual deverá ser delicada, sem grandes movimentos abrutalhados, e sem grandes acrobacias ou mudanças de posições ou, ainda, sem posições esdrúxulas.
A gestação é mais estável do quarto ao sétimo mês, desde que não haja placenta de implantação baixa ou placenta prévia; até o quinto mês, a posição poderá ser tipo "papai-mamãe" (o homem por cima da mulher deitada na horizontal, de barriga para cima). Do quinto mês em diante, a relação deverá ser de lado; isso é válido principalmente após o sétimo mês, devido ao risco de estimulação da contração uterina e, obviamente, de parto prematuro.
O casal deverá deitar-se de lado na cama, um em frente ao outro, em paralelo; assim, não haverá condições de um jogar o peso do corpo, cima do outro, e a penetração do pênis, sendo menos profunda, não permitirá que o membro bata no colo uterino, não estimulando, portanto, a contração uterina. A relação não deve, também, ser muito demorada ou prolongada, pois orgasmos repetidos também estimulam a contração. Além disso, a vagina, estando tumefeita e congesta devido ao aumento da circulação e a repleção venosa, está mais sujeita a irritação, infecção (corrimento) sangramento.
Com todo o cuidado, o casal poderá ter relações até o oitavo mês e meio ou, mesmo, nas proximidades do parto. Após o parto, deverão reiniciar as atividades sexuais após quarenta dias, quando o colo uterino se encontra fechado, o sangramento pós-parto já cessou e o útero já sofreu uma boa involução.
O marido deve ter muita paciência e ser participativo, pois metade do material genético é de sua responsabilidade. A mulher, quando fica grávida, sofre modificações muito grandes na sua estrutura física, mental, psicológica e social - fica mais insegura, mais agressiva, chora com facilidade e, muitas vezes, fica cheia de caprichos e desejos. É fácil entender estes mecanismos e atitudes, pois a mulher é semelhante a toda fêmea prenhe que quer defender a sua futura cria (ou, no caso dos ovíparos, o seu ovo). É como se o resto do universo fosse inimigo e hostil; a agressividade se volta inclusive contra o marido ou os familiares - portanto, é preciso que haja muita paciência, muito diálogo, muita atenção e muito carinho, para não se desestruturar a estabilidade já precária da gestante.
Toda vez que houver condições de o marido atender a um capricho da gestante, deverá fazê-lo, desde que não seja absurdo; neste caso, deverá dialogar com ela e mostrar a impossibilidade da execução do mesmo, e, não, recusar diretamente o pedido.
Também não deverá forçar a relação sexual, pois, na gestação, na grande maioria das vezes, existe uma diminuição da libido - nenhum animal prenhe aceita a cópula; o ser humano é o único que continua a atividade sexual em caso de gravidez. O marido deve ter cuidado para não forçar esta situação, pois daí poderá advir conseqüências graves no relacionamento do casal e a mulher poderá se sentir humilhada, ultrajada ou, mesmo, ter a sensação de ser estuprada. Deve-se procurar, sempre, respeitar este aspecto.
O companheiro deve, sempre, conversar a respeito da gravidez, saber como a gestante se sente, ouvir suas queixas, traçar planos futuros, estimulá-Ia a atividades saudáveis e criativas como leitura, exercícios, etc. Deve participar das massagens recomendadas para o corpo dela e, sempre que possível, em fase mais adiantada da gravidez, ajudá-Ia a se levantar ou fazer serviços para os quais ela se encontre impossibilitada, como carregar muito peso ou abaixar-se demais, poupando-lhe esforços que possam causar dor ou contração uterina.
Quando a gestante estiver sozinha, deverá, ao sair da cama, seguir a seqüência: virar de lado, colocar uma perna para fora da cama em seguida à outra e apoiar a suspensão do corpo, usando o braço de baixo.
É interessante o marido, sempre que possível, acompanhar o trabalho de parto da mulher e, também, estar presente por ocasião do nascimento do bebê, quer seja parto normal, quer seja cesárea, pois, assim, irá valorizar e enaltecer o desempenho e tudo o que a mulher passou no transcorrer da gravidez e da maternidade.
O marido deve, junto com todos os familiares, criar um ambiente calmo, alegre, receptivo e extremamente voltado a todo o apoio e segurança à grávida. Só assim ela terá uma gestação saudável sem percalços.
Dr. Jorge Naufal, médico ginecologista e obstetra, formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo em 1964. Foi acadêmico plantonista na Casa Maternal Leonor Mendes de Barros e na Maternidade de São Paulo. Fez residência médica de 3 anos no Dpto. de Ginecologia e Obstetrícia no Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, tendo sido professor assistente-voluntário. Foi professor de obstetrícia na Escola de Enfermagem Obstétrica da Universidade de São Paulo; foi fundador do depto. Médico do Instituto Municipal de Previdência de São Bernardo do Campo. Foi fundador e é um dos sócios da Neomater Hospital e Maternidade, localizado em São Bernardo do Campo. É autor do livro "Gravidez - Um Caminho Seguro", já em sua segunda edição.

Sexualidade na gestação e no período pós-parto: o que muda?

A sexualidade feminina começou a ser estudada cientificamente por Freud há cerca de um século, mas diversos aspectos ainda permanecem obscuros.
A vida sexual da mulher pode ser pareada à sua etapa da vida reprodutiva. Nos primeiros anos da infância a menina descobre seu papel feminino e pode estabelecer uma relação edipiana com o pai ou com a figura paterna que exerça sua função; mais tarde, já na adolescência, a sexualidade feminina amadurece e passa a encontrar um foco específico, normalmente o indivíduo-alvo do desejo sexual. Os anos seguintes costumam ser vividos mais intensamente na esfera sexual, o número de parceiros pode variar mais, a mulher passa a reconhecer seus desejos, suas preferências, seus tabus e, fundamentalmente, sua imagem na sociedade e também como mulher-amante. Nessa etapa, se encontrar uma parceria mais fixa e decidir ter um bebê, nova mudança de papéis se seguirá, mas, definitivamente, esta será uma das mudanças mais profundas por que ela passará durante toda sua vida.
A transformação do papel mulher-amante em mãe-mulher-amante não é nada fácil para a imensa maioria das pessoas. Por mulher-amante entendemos uma figura feminina voltada para si e para o seu parceiro; ela tem tempo e grande preocupação em cuidar de si mesma e do outro, pode e quer se arrumar, praticar esportes, vivenciar a moda, curtir programas noturnos, restaurantes... enfim, namorar. A chegada de um bebê – uma avalanche em qualquer família, mesmo sendo a melhor e mais emocionante avalanche do mundo – transforma essa “namorada”, subitamente, na pessoa mais importante e responsável pela nutrição, carinho, crescimento e saúde de um ser que sequer existia até alguns meses atrás, mas, ressaltando novamente, um ‘serzinho’ novo, que não era, até então, o foco do desejo sexual daquela mulher.
A transformação por que passamos durante o período de algumas horas é tão intensa, a mudança de papéis tão dramática, que não raramente nos pegamos, ainda na maternidade, debruçadas ao lado do bercinho, chorando ao olhar aquela criaturinha linda, saudável, perfeita, saída de dentro da nossa barriga! E choramos por tudo, ou quase tudo... Ouvir o bebê chorar nos deixa angustiada, amamentar não é fácil, passar noites e noites acordando a cada hora e meia deixa qualquer uma deprimida. E o que não sentimos quando as pessoas nos olham e falam: você deve estar super feliz, seu bebê é lindo! Sentimo-nos a pior das criaturas, pois não estamos nos sentindo tão felizes assim.
E é justamente nessa realidade que, após a famosa “quarentena” – período de cerca de 30 a 40 dias pós-parto em que não se deve ter relações sexuais – temos que mostrar aos nossos companheiros que a aquela mulher-amante não morreu! Na verdade os parceiros aguardam ansiosamente por esse grande dia, o dia da libertação! Muitos deles estiveram cultivando um jejum sexual desde os últimos meses da gestação, pois poucas mulheres conseguem ter relações normais até o parto, onde encontrem satisfação que sobreponha os incômodos da fase final da gestação. A ansiedade que banha esse momento de reestréia sexual no casal é grande; o marido sonha em reencontrar a esposa-amante, mas ela sabe que esse reencontro não será fácil.
A puérpera – nome dado à mulher que deu à luz recentemente – enfrenta uma redução muito acentuada na libido. Diversos fatores podem explicar tal situação, muitos relacionados aos altos níveis de prolactina, hormônio responsável pela manutenção do aleitamento, mas que também causa secura vaginal e diminuição do desejo sexual. Outros fatores estão relacionados ao cansaço próprio desta fase de grande privação de sono e também ao processo de cicatrização dos procedimentos utilizados no parto, quer tenha sido a episiotomia do parto normal ou a incisão cirúrgica da cesariana. Costumo explicar às pacientes que, a meu ver, a natureza nessa fase é bastante sábia: ela dificulta ao máximo a atividade sexual, reduzindo a libido, promovendo secura vaginal e dor ao ato sexual pela secura extrema, deixando a paciente num grau tão grande de cansaço que, quando ela se deita, só pensa em dormir... tudo isso para evitar que ocorra a relação e, consequentemente, que a mulher engravide novamente. Mas por que tudo isso? Porque se a mãe engravidar agora, o aleitamento será interrompido, já que a gestante poupa seu organismo em benefício do crescimento do embrião. Então, para não engravidar com 100% de segurança, só praticando a abstinência sexual!
E o relacionamento, o casamento, como ficam perante essa situação? É aí que começa o papel “mulher-maravilha”: precisamos ser mães e donas-de-casa em tempo integral, já que a função abençoada não respeita finais de semana ou feriados e funciona 24 horas por dia; somos, grande parte das vezes, profissionais que não querem e nem podem abandonar suas careiras em nome dos pimpolhos (afinal não estudamos e investimos tanto em nós mesmas até hoje para nos limitar a trocar fraldas e dar mamadeiras) e, por fim, somos aquelas mulheres-amantes por quem nossos companheiros se interessaram e decidiram abraçar o projeto bebê. Podemos exercer o papel de mãe automaticamente, por instinto mesmo. Retomar a carreira profissional, às vezes, requer um esforço pessoal razoável – dá uma vontade enorme de encurtar o período laborativo para lamber as crias! E a amante??? Onde está?
Neste momento o papel do ginecologista que acompanhou e acompanha a paciente é de suma importância: explicar tudo o que relatei acima com clareza e disposição para ouvir sua paciente, sugerir algumas mudanças no cotidiano que facilitem a readequação da mulher nesses 3 papéis vitais e, além disso, reconhecer alguns sintomas comuns dessa fase distinguindo a tristeza ou “blues” puerperal normais da famigerada depressão pós-parto.
Encerro essas reflexões realçando que, na Medicina, como em qualquer outra área da saúde, o bom relacionamento médico-paciente é fundamental. Ouvir a paciente, conversar abertamente sobre essas questões e explicar conceitos médico-científicos que estão rodeando questões enfrentadas por todas nós, mulheres, facilitam a passagem por este período turbulento e tornam nossa mãe-mulher-amante-paciente muito mais feliz e realizada.
Dra. Flávia Fairbanks
Graduada pela Faculdade de Medicina da USP, realizou residência médica em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital das Clínicas da FMUSP, foi médica preceptora da Ginecologia do Hospital das Clínicas da FMUSP. É Pós-graduada em Ginecologia do Hospital das Clínicas da FMUSP nos setores de Endometriose e Sexualidade Humana.